Os Desafios da Medição Harmônica no Sistema Elétrico de Potência: a Influência da Resposta em Frequência de Transformadores de Potencial

Por: Bárbara Morais Gianesini - Ivan Nunes Santos - Raquel Cristina Filiagi Gregory - Vinícius Henrique Farias Brito

Os sistemas elétricos de potência têm passado por grandes transformações nos últimos anos, as quais são motivadas pelo crescente incentivo de práticas sustentáveis para a construção de novos modelos de mercado de energia, cujos pilares se baseiam nos processos de descarbonização, descentralização e digitalização. Com isso, novas filosofias tomaram o protagonismo no setor elétrico, as quais possibilitaram o avanço de tecnologias e aumento da eficiência energética dos sistemas.

Nesse sentido, devido à popularização de equipamentos não lineares associados às novas tecnologias, o monitoramento e gestão dos indicadores de distorção harmônica, principalmente em barramentos da Rede Básica e fronteiras, têm se tornado assunto de grande preocupação para os diferentes agentes do setor elétrico.

Em se tratando do monitoramento da qualidade do produto na Rede Básica, um dos grandes desafios da atualidade abrange o aspecto de confiabilidade das medições. No tocante aos transdutores de tensão, os quais são tipicamente empregados para fins de proteção e medição, é fato que estes instrumentos podem apresentar resposta não linear para faixas de frequência não fundamental, o que pode acarretar erros de medição [1]. A fim de ilustrar este comportamento, a Figura 1 apresenta os Fatores de Correção de Relação de Transformação de magnitude (a) e fase (b), de três Transformadores de Potencial Indutivo (TPI), para redes de 34,5 kV, contendo as mesmas características e especificações técnicas (fabricante, modelo, tensão nominal, etc.).

(a)

(b)

Figura 1 – Fatores de Relação de Transformação de TPIs para redes de 34,5 kV: (a) magnitude; (b) ângulo de fase.

Com base na Figura 1, embora seja possível observar um comportamento com mesma tendência para os três instrumentos, nota-se certa diferença entre as respostas, sobretudo em termos do ângulo de fase, cuja não linearidade é mais expressiva. Neste aspecto, é oportuno salientar que o grau de não linearidade pode ser consideravelmente expressivo a depender da característica construtiva do instrumento, sendo mais evidente em TPs do tipo capacitivo (TPC). 

Para TPIs, a não linearidade se mostra mais evidente para instrumentos de maior classe de tensão, dado o aumento do efeito capacitivo que contribui para a intensificação da não linearidade [1]. Assim, a fim de ilustrar este comportamento, a Figura 2 apresenta os Fatores de Correção de Relação de Transformação de magnitude de três TPIs para redes com tensão nominal de 138 kV (a) e 69 kV (b) de diferentes fabricantes e modelos.

(a)

(b)

Sendo assim, em sistemas elétricos de potência, é altamente desejável investigar o comportamento em frequência destes instrumentos, de forma a garantir a confiabilidade das medições de distorção harmônica.

Diante das preocupações levantadas, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), por meio das diretrizes definidas no Submódulo 2.9 dos Procedimentos de Rede e em relatórios técnicos complementares, como a NT ONS/009.2016, estabelece a imprescindibilidade dos ensaios de resposta em frequência de transdutores para correção de valores de medição de distorção harmônica. 

Estas diretrizes se embasam em práticas recomendadas por padrões internacionais, a exemplo da IEC TR 61869-103. Porém, uma questão relevante e que carece de maiores reflexões se refere à padronização dos procedimentos de ensaio de resposta em frequência recomendados pela regulamentação. 

Uma prática comum para a realização destes ensaios, e que consta no relatório técnico Re. ONS – 2.1-028/2005, se trata da aplicação de um sinal de baixa magnitude ao enrolamento primário do TP, o qual é composto de frequências múltiplas da fundamental. No entanto, para alguns tipos de instrumento, como o TPI, existe influência da tensão fundamental da rede sobre a sua resposta em frequência, dado o comportamento não linear do fluxo magnético em função da amplitude e frequência da tensão aplicada. Assim, negligenciar a influência da tensão nominal para a realização dos ensaios pode apresentar uma resposta que não reflete a realidade física experimentada, comprometendo a confiabilidade das medições. 

Para avaliar a influência da tensão fundamental da rede na resposta em frequência de TPIs e TPCs, uma abordagem mais fidedigna consiste em incluir, no procedimento de ensaio, a contribuição desta componente acrescida das harmônicas, conforme recomendado na IEC TR 61869-103. Neste aspecto, na literatura são apresentados estudos comparativos entre os procedimentos mencionados utilizando TPs de média tensão, cujas diferenças não se mostram expressivas devido às características dos instrumentos dessa classe de tensão [1], [2]. Todavia, em se tratando de TPIs de alta tensão, há uma certa carência de estudos dessa natureza, sendo este aspecto motivador para a continuidade das investigações neste campo de pesquisa.

Portanto, a avaliação da real influência do comportamento em frequência dos transdutores de tensão sobre as distorções harmônicas manifestadas na Rede Básica e em seu barramento de fronteira se trata de um assunto de grande relevância no contexto atual, haja vista a necessidade de se estabelecer um referencial que permita a realização de estudos dessa natureza sem negligenciar a real influência da resposta em frequência sobre os resultados de medição das distorções harmônicas.

Referências Bibliográficas: 

[1] M. Klatt, J. Meyer, M. Elst and P. Schegner, “Frequency Responses of MV voltage transformers in the range of 50 Hz to 10 kHz,” Proceedings of 14th International Conference on Harmonics and Quality of Power – ICHQP 2010, Bergamo, Italy, 2010, pp. 1-6, doi: 10.1109/ICHQP.2010.5625484.

[2] R. Stiegler, J. Meyer, and P. Schegner, “Portable measurement system for the frequency response of voltage transformers,” International Conference on Harmonics and Quality of Power (ICHQP), June 2012, Hong Kong, China.

Autores:

Por Raquel Cristina Filiagi Gregory, professora Dra. da Universidade Federal do Ceará e Pesquisadora do GREI-UFC e NQEE-UFU; 

Por Vinícius Henrique Farias Brito, doutorando da Universidade Federal de Uberlândia e Pesquisador do NQEE-UFU; 

Por Bárbara Morais Gianesini, doutoranda da Universidade Federal de Uberlândia e Pesquisadora do NQEE-UFU;

Por Ivan Nunes Santos, professor doutor da Universidade Federal de Uberlândia e Coordenador do NQEE-UFU.

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