Marco histórico no setor de baixa tensão

Edição 97 – Fevereiro de 2014
Por Bruno Moreira

Portaria nº 51 do Inmetro, que fornece diretrizes para a certificação voluntária das instalações elétricas de baixa tensão, finalmente, é publicada e deve dar força para o setor nesta demanda antiga.

O dia 30 de janeiro de 2014 tornou-se um marco histórico para os profissionais da área de engenharia elétrica de todo o país. Isto porque nesta data foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) a Portaria nº 51 do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), que aborda os Requisitos de Avaliação da Conformidade (RAC) para Instalações Elétricas de Baixa Tensão ou, em outras palavras, fornece as diretrizes para a certificação voluntária dessas instalações.

Trata-se de uma demanda antiga dos profissionais da área: a certificação. Ela surge como uma garantia de que as instalações projetadas estão de acordo com as regras presentes na norma ABNT NBR 5410, que estabelece as condições que devem satisfazer as instalações elétricas em baixa tensão (BT). Com este tipo de chancela, haveria uma garantia de que a instalação está funcionando corretamente e de que pessoas, animais e bens materiais estão seguros.

Para muitos destes profissionais a certificação deveria ser obrigatória. Por exemplo, atrelada ao Habite-se, documento emitido pela prefeitura de um determinado município atestando que o imóvel foi construído em acordo com as exigências estabelecidas para a aprovação de projetos. Apenas com o Habite-se uma edificação pode ser efetivamente utilizada e, neste caso, sem a certificação não haveria este aval.

No início dos anos 1990, alguns profissionais do setor chegaram a visitar a prefeitura de São Paulo para saber se haveria possibilidade de isso se tornar realidade. Fizeram uma reunião com representantes do Departamento de Controle do Uso de Imóveis (Contru) do município de São Paulo, mas não obtiveram êxito. De acordo com o engenheiro eletricista e sócio da Barreto Engenharia, Paulo Barreto, que participou desse movimento, a resposta na ocasião foi de que a obrigatoriedade já estava contemplada no código de obras das legislações municipais. “Mas é óbvio que isso não era verificado”, diz Barreto.

Outra estratégia para tornar compulsória a certificação seria vincular a ligação da energia elétrica nos estabelecimentos a ela. Segundo o engenheiro eletricista, diretor da Hilton Moreno Consulting, Hilton Moreno, no final da década de 1990, diversos órgãos do setor interessados nessa causa chegaram a fazer reuniões com a recém-criada agência, que sinalizava na direção de atender às demandas dos profissionais envolvidos com instalações elétrica em BT. O Inmetro seria chamado posteriormente pela Aneel para atuar como desenvolvedor e gestor desse documento oficial. O formato foi construído na ocasião, porém, não houve a continuidade do tema até este momento.

Apesar dos reveses, as diversas associações do setor não desistiram da ideia da certificação. Chegaram em 2008 a fundar a Certiel Brasil, entidade que desde então promove e realiza a certificação voluntária das instalações elétricas em baixa tensão, mas em caráter não oficial. Faltava ainda um documento que regulamentasse este segmento para que a pauta ganhasse força. Diversas empresas públicas pediam por isso, inclusive. E esta norma veio com a portaria nº 51 do Inmetro.

Conforme Moreno, esta portaria é um refinamento de todos os documentos técnicos que começaram a ser produzidos desde o final da década de 1980 e começo da década de 1990, objetivando a certificação das instalações BT.

Momento de divulgar

Atualmente, as entidades do setor estão na etapa de divulgação do documento normativo. De acordo com o diretor executivo do Sindicato da Indústria de Condutores Elétricos, Trefilação, Laminação de Metais Não Ferrosos do Estado de São Paulo (Sindicel), Valdemir Romero, todas as associações e sindicatos do setor elétrico já estão divulgando a portaria de forma intensiva. “O Sindicel, por exemplo, publicou em seu site e enviou mala direta e e-mail marketing para seus associados a respeito do tema”, diz o diretor.

Do mesmo modo, o Instituto Brasileiro do Cobre (Procobre) vem divulgando internamente junto a seus associados a portaria nº 51 do Inmetro. E em meados deste ano, conforme o diretor executivo do entidade, Antonio Maschietto, será publicado um dossiê a respeito das instalações elétricas do país em que este assunto da portaria do Inmetro certamente será abordado.

Outra entidade do setor que vem trabalhando no intuito de difundir o conteúdo do documento do Inmetro é a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). De acordo com o analista sênior de normas técnicas da associação, Geraldo Takeo Nawa, além de divulgar a portaria em boletins eletrônicos, a entidade está fazendo reuniões com os associados com o objetivo de debater o documento recém publicado.

Embora o público-alvo das certificações de instalações elétricas em BT não sejam associados da Abinee, em sua maioria fabricantes, o superintendente da Certiel Brasil, Eduardo Daniel, que esteve presente em uma dessas reuniões, acredita que os associados podem ajudar a difundir a portaria. “Ao vender um produto a uma determinada empresa, eles podem falar a respeito da importância da certificação”, diz Daniel, salientando que pretende contar com a colaboração de todos nesta tarefa.

De olho nas empresas públicas

A portaria do Inmetro finalmente saiu. E com uma legislação que ancore este segmento, os profissionais preocupados com esta causa renovaram suas esperanças na luta pela certificação das instalações em baixa tensão. Contudo, há sempre o receio de que isso não seja suficiente – mesmo porque se trata de um documento que remete à certificação em âmbito voluntário – e que a procura por certificações não aumente.

Segundo o analista sênior de normas técnicas da Abinee, Geraldo Takeo Nawa, para evitar que a luta pela certificação que culminou na portaria do Inmetro não seja vã, a meta das associações deve ser a de criar “uma massa crítica”, melhor explicando, conseguir algumas companhias que aceitem certificar suas instala&ccedi

l;ões para estimular outras a fazerem o mesmo. E, de acordo com o superintendente da Certiel, as empresas públicas são candidatas interessantes, até porque, como dito, elas estão esperando por isso.

A expectativa, conforme Eduardo Daniel, é de que, a partir da portaria do Inmetro, empresas como a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) do Estado de São Paulo, o Banco Central e a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) adquiram mais confiança para, nos editais públicos – objetivando contratar empresas para construir edificações públicas –, exigir instalações elétricas certificadas. Dessa forma, a certificação, que é voluntária, se tornaria obrigatória via edital.

Um dos principais focos atuais das entidades do setor é a CHDU. A empresa pública investe apenas em casas e apartamentos populares. São cerca de 80 mil residências por ano, o que seria um número inicial considerável de instalações certificadas e serviria para alavancar outras mais. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, o Banco Central e a Infraero também foram prospectados, segundo o analista sênior da Abinee. “São potenciais clientes”, diz Nawa.

A Infraero, por exemplo, como conta Daniel, já coloca em seus editais públicos a exigência da certificação por um organismo acreditado pelo Inmetro. Contudo, sem uma legislação como esta do instituto de metrologia ficava inviável. Criava um problema, pois não havia um organismo certificador com estas características.

Agora, com a portaria, há regras que estabelecem as diretrizes e que permitirão a organismos de certificações de instalação elétrica (designados pelo Inmetro como OCP) receberem a chancela por parte do Inmetro, e que, por sua vez, possibilitarão que empresas consigam se adequar aos editais da Infraero.


A portaria é um refinamento de todos os documentos técnicos que começaram a ser produzidos desde o final da década de 1980, objetivando a certificação das instalações BT.

Passo importante

“A luta continua”, diz o superintendente da Certiel, falando sobre o trabalho das entidades do setor com o objetivo de certificarem o maior número possível de instalações elétricas em baixa tensão. “A certificação compulsória não sai do nosso radar”, complementa Eduardo Daniel, justificando que o Inmetro não poderia nunca soltar uma portaria dando diretrizes para a certificação compulsória. “Isso não é competência dele. Saiu a portaria que a gente sabia que ia sair”, declara.

Contudo, segundo o analista sênior de normas técnicas da Abinee, mesmo a portaria dizendo respeito à certificação em caráter voluntário, trata-se de um avanço que, para o diretor executivo do Sindicel, Valdemir Romero, servirá como um estímulo a vários setores da sociedade a fim de que certifiquem suas instalações elétricas em baixa tensão. “A portaria, com certeza, foi um passo importante que o setor elétrico irá defender”, declara Romero.

Para o diretor executivo da Associação Brasileira pela Conformidade e Eficiência de Instalações (Abrinstal), Alberto Fossa, o fato de já ter havido várias iniciativas que não deram muito certo no passado acomodou o mercado com um certo descrédito em relação a esta pauta. Contudo, para ele, esta nova iniciativa, aliada a ações complementares do setor pode representar uma nova etapa na busca da conformidade das instalações elétricas no Brasil. “O setor recebe a notícia renovando suas esperanças de poder avançar na busca por instalações mais seguras e conformes”, afirma.

O diretor da Hilton Moreno Consulting define a portaria nº 51 como um documento que coloca à disposição da sociedade regras que permitam a qualquer um que queira certificar uma instalação elétrica em baixa tensão poder fazê-lo com a chancela do Inmetro. “Mesmo que em caráter voluntário, essa portaria possibilita balizar o mercado a respeito das regras a serem seguidas e sobre a melhor forma de fazer essa certificação”, explica o consultor.

Em suma, esta portaria possibilitaria que as instalações certificadas por organismos acreditados pelo Inmetro recebessem o selo do instituto, assim como já ocorre com os demais produtos elétricos e de outros segmentos industriais. De acordo com o diretor da Hilton Moreno Consulting, este selo traria reconhecimento à empresa com as instalações certificadas, justamente porque estas trariam a marca do Inmetro, uma instituição renomada.

Moreno espera, aliás, que tal possibilidade estimule as construtoras a certificarem as instalações elétricas em BT de seus empreendimentos imobiliários. Na ótica dele, o selo do Inmetro poderia fazer parte da estratégia de marketing dessas empresas, funcionando como um chamariz para a venda. Seriam apartamentos – comerciais ou residenciais – com instalações elétricas exibindo selos com a marca do Inmetro, o que, como dito, forneceria credibilidade à edificação.

Assim como os demais especialistas ouvidos pela reportagem, o engenheiro eletricista também acredita que a portaria do Inmetro só surtirá o efeito desejado se encontrar eco na sociedade. Mas para isso ocorrer é preciso que se gere casos de sucesso. “É preciso ter alguém que acredita na portaria”, diz o diretor da Hilton Moreno Consulting. Como mencionado anteriormente, empresas públicas são o alvo inicial dos agentes com o objetivo de difundir a portaria e o uso da certificação.

Com o impulso dessas empresas, os profissionais do setor que lutam há anos por esta causa acreditam que seja dado um estímulo para o uso em grande escala das certificações. Após criado esse movimento, conforme Moreno, é possível que seja criado um ambiente favorável para a discussão da certificação compulsória das instalações.

Outra maneira para que o uso da certificação se difundisse mais rapidamente seria um aculturamento da sociedade no sentido de que as pessoas se conscientizassem a respeito da importância de uma instalação elétrica certificada. “Assim não haveria necessidade de obrigar ninguém. Seria algo voluntário realmente”, diz o diretor executivo do Procobre, destacando que a instalação elétrica não é ainda uma prioridade para a população. “As pessoas só se preocupam quando há um acidente, mas aí já é tarde”, complementa.

Condensando os argumentos de seus dois colegas de setor, Fossa acredita que a sociedade precisa decidir-se se ela está disposta a pagar o preço da conformidade. Conforme ele, em muitos países esse debate é ma

duro o suficiente para que a compulsoriedade seja estabelecida de forma consensual e em outros não, ficando a cargo do governo proteger o consumidor pela adoção de práticas e controles obrigatórios como a compulsoriedade. “De qualquer forma, o surgimento da portaria é um passo importante para que se inicie um debate sério sobre essas condições”, define o diretor.

Um retrato do projeto

Não obstante a falta de preocupação da maioria da população com as instalações elétricas das edificações, os profissionais do setor destacam uma série de benefícios consequentes do uso da certificação. Tirando o óbvio de que uma instalação certificada está de acordo com as normas do segmento e nesse sentido é mais segura e por isso menos suscetível a acidentes, a certificação também serve para auxiliar projetistas e instaladores.

Segundo o analista da Abinee, com a certificação será possível verificar se aquilo que foi projetado realmente foi colocado em prática. A certificação funcionará também como um retrato do projeto para que o instalador, futuramente, caso haja algum acidente envolvendo a instalação elétrica, possa provar que a edificação foi realizada de forma adequada e que o acidente foi ocasionado por alguma modificação posterior.

A certificação pode favorecer também as empresas seguradoras. De acordo com Nawa, o selo do Inmetro aprovando as instalações elétricas em baixa tensão poderia ser utilizado pelas companhias que disponibilizam este tipo de serviço para que elas estipulem o valor do prêmio de forma diferenciada.

Isso seria uma maneira de atrelar o prêmio pago pelo seguro de uma determinada edificação à existência da certificação e, assim, incentivar o uso da certificação e ao mesmo tempo tornar o negócio mais atrativo aos clientes. O analista da Abinee conta, no entanto, que isso já foi mencionado pelos profissionais do setor elétrico a estas empresas, que ouviram a proposta sem muito entusiasmo.

O Procobre também acredita que as empresas integrantes da associação poderão ser beneficiadas caso o processo de certificação ganhe corpo e vire regra nas instalações elétricas brasileiras. Conforme o diretor executivo do instituto, como as instalações possuem cobre em sua composição, a portaria nº 51 do Inmetro aparece como um documento importante às empresas que fazem parte do Procobre. “É bom saber que as instalações que utilizam nossos produtos estão certificadas”, diz Maschietto.

Duas grandes contribuições

A respeito da parte técnica da portaria nº 51 do Inmetro, o diretor da Hilton Moreno Consulting explica que ela se baseia no cumprimento da integralidade da parte 7 da norma ABNT NBR 5410. Tal segmento trata sobre a análise da documentação, a inspeção visual e os ensaios das instalações elétricas. No entanto, conforme o especialista, o documento introduz duas grandes contribuições: uma sobre o método de amostragem e outra sobre edifícios com subestações.

No que se refere à primeira contribuição, o engenheiro eletricista explica que a portaria estabelece um critério de amostragem para definir a quantidade de unidades que devem ser ensaiadas em edificações que possuem unidades consumidoras equivalentes, como prédio de apartamentos residenciais, no qual as instalações elétricas são construídas seguindo um padrão para todas as unidades domiciliares. Nestes casos, não faria sentido inspecionar e certificar todas as instalações, pois elas, a princípio, teriam a mesma estrutura.

A segunda contribuição diz respeito a edifícios alimentados em média tensão, cujas subestações estão localizadas dentro dos limites da construção. Como regra, quando a potência instalada de um determinada edificação é de 75 KW, esta instalação tem que ser alimentada em média tensão e, neste caso, há a necessidade de uma subestação. Esta, por sua vez, pode ser um transformador instalado em um poste na rua ou dentro do edifício. No último caso, a portaria solicita a inspeção visual na parte da subestação – e apenas nesta parte – que faz a transição da média tensão para a baixa tensão.

Outras duas particularidades que merecem destaque nesta portaria, segundo Moreno, dizem respeito aos itens 6.2.1.1 e 6.2.1.3, ambos relacionados aos documentos que o solicitante deve enviar ao Organismo Certificador de Instalação (OCI). O primeiro item orienta que, no caso específico de instalações elétricas residenciais com potência instalada de até 12 kW, o solicitante pode apresentar somente o diagrama unifilar completo e o manual do usuário.

Já o segundo item afirma que, nos casos em que as instalações elétricas a serem avaliadas possuírem um carga instalada igual ou superior a 75 kW, deve ser apresentado, além da documentação pedida a instalações alimentadas com outras potências, o Prontuário das Instalações Elétricas, de acordo com os requisitos indicados na Norma Regulamentadora nº 10 (NR 10).


Infraero

A Infraero é um exemplo de empresa pública que vem trabalhando em conjunto com as associações do setor elétrico com o objetivo de difundir o uso das certificações em instalações elétricas BT no país. Como dito, mesmo antes da publicação da portaria, ela já exigia dos participantes de editais públicos realizados por ela que certificassem as instalações edificadas por eles.

Além disso, segundo o superintendente de manutenção da Infraero, Anderson Dias Goddard, a companhia elabora todos os projetos das instalações elétricas dos aeroportos em conformidade com as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). A Infraero também capacita seus profissionais técnicos “por meio da realização de treinamentos corporativos com o objetivo de atualizá-los sobre os procedimentos e orientações contidas nas normas da ABNT e legislações específicas”, diz Goddard.

Todo este cuidado e interesse da empresa em ver as instalações de seus aeroportos de acordo com a norma tem uma razão. “A Infraero tem o compromisso de oferecer aos seus clientes o melhor serviço de infraestrutura aeroportuária do país”, afirma o superintendente, salientando que a certificação, mesmo que em caráter voluntário, vem ao encontro de oficializar este compromisso, pois garantirá aos usuários dos aeroportos qualidade, conforto e segurança.

Agora com a publicação da portaria nº 51 do Inmetro e a oficialização da certificação voluntária, a Infraero não pretende perder tempo.
Segundo Goddard, a empresa deverá analisar seus processos internos e projetos em andamento assim que possível, com o objetivo de verificar “as adequações necessárias para solicitar e conquistar a referida certificação”.


 

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