Operação dinâmica de bancos de capacitores com eliminação de correntes de inrush

Edição 53 – Junho de 2010
Por Gleisson J. Franco, Marcos Isoni Silva e Sidelmo Magalhães Silva

Bancos de capacitores chaveados a tiristores são opção para instalações com grande número de operações e evita o pagamento de multas por fator de potência inadequado.

 

 

A correção do fator de potência por meio de bancos de capacitores fixos tem sido amplamente utilizada em sistemas industriais. Nestes sistemas, as variações de demanda por compensação de reativos são, na maioria dos casos, lentas, o que implica um pequeno número de manobras diárias dos bancos de capacitores, tipicamente realizadas por contatores e resistores de pré-inserção.

Entretanto, são bastante conhecidas e descritas na literatura [3-8] situações envolvendo sistemas com demandas dinâmicas e variáveis de potência reativa, como é o caso de indústrias automobilísticas, caracterizadas pelo elevado número de prensas e máquinas de soldagem de ponto; e dos sistemas de geração eólica, sujeitos aos regimes variáveis de ventos e à operação em paralelo de um grande número de geradores sob diferentes condições de disponibilidade de potência.

Nestes sistemas, o alto número de manobras diárias necessárias e as variações dinâmicas de demanda de reativos impossibilitam a utilização dos sistemas convencionais baseados em contatores e resistores de pré-inserção. Assim, as indústrias sujeitas ao pagamento de altas multas por fator de potência, mesmo com a instalação de bancos de capacitores capazes de atender à máxima demanda de reativos da planta.

Uma opção que vem sendo aplicada de forma crescente para estes casos são os bancos de capacitores chaveados a tiristores. Entre as vantagens destes sobre os sistemas convencionais de manobra por contatores, destacam-se:

• Possibilidade de um grande número de operações;

• Eliminação das correntes de inrush;

• Aumento da vida útil dos elementos do banco;

• Conexão rápida, sem a necessidade de atraso para descarga dos capacitores;

• Eliminação dos resistores de pré-carga e descarga do banco;

• Tempo de manobra máximo inferior a um ciclo;

• Menores custos de manutenção, embora com maiores custos de implantação;

• Possibilidade de incorporação de funções de monitorização e proteção do banco, como proteção contra ressonância, detecção de falhas em elementos do banco (capacitância fora da faixa especificada), entre outros;

• Utilização plena dos bancos de capacitores, maximizando os benefícios do investimento realizado.

Este trabalho apresenta uma análise da operação de um sistema de manobra de bancos de capacitores baseado em tiristores. São discutidos aspectos relativos ao sistema de controle para eliminação das correntes de inrush, além dos algoritmos para detecção de condições de ressonância e capacitância fora da faixa especificada. Resultados experimentais obtidos com o sistema Pro Factor® são incluídos, juntamente com resultados de sua aplicação para a compensação do fator de potência em uma indústria do setor automobilístico.

Compensação de fator de potência em cargas dinâmicas

Sistemas industriais caracterizados por elevado número de cargas dinâmicas, como máquinas de soldagem de ponto, prensas, elevadores e pontes rolantes estão sujeitos a um perfil de demanda de reativos com variações rápidas e contínuas. Este regime de operação torna inadequados os sistemas de compensação de reativos baseados em bancos de capacitores operados por contatores e resistores de pré-inserção.

A razão para isso se deve, principalmente, aos seguintes fatores:

• Impossibilidade de controle do tempo de fechamento dos dispositivos eletromecânicos, aliado à impossibilidade de comando independente por fase;

• Necessidade de se aguardar tempos de descarga dos capacitores, superiores a um minuto, para evitar correntes de inrush ainda mais elevadas;

• Possibilidade real de subutilização dos bancos de capacitores em aplicações com cargas de dinâmica rápida, gerando um aproveitamento apenas parcial do investimento realizado.

A Figura 1 ilustra os resultados de medições do fator de potência não compensado em uma indústria do setor automobilístico, a qual possui centenas de máquinas de soldagem de ponto. Estas máquinas operam com um ciclo de trabalho de, aproximadamente, 500 ms. O fator de potência médio não compensado apresenta um valor em torno de 0,62 indutivo.

 

Na Figura 1, o intervalo de amostragem utilizado foi de 100 ms, de modo que a curva mostrada foi obtida a partir de uma medição em um tempo total de dois minutos. A Figura 2 ilustra o fator de potência da instalação em uma janela de tempo mais curta. Observe as bruscas variações de demanda de reativos da planta, na qual em um intervalo de um segundo o fator de potência pode variar de 0,5 para 0,8 indutivo.

Figura 2 – Medição da variação dinâmica do fator de potência da instalação. Tempo total: 10 segundos.

A Figura 3 ilustra um diagrama esquemático simplificado do ramal da planta considerado. O sistema consiste de dois alimentadores gerais em 440 V, cada qual suprido por dois transformadores com potências individuais de 1250 kVA. A distribuição da energia para as máquinas de soldagem é realizada por meio de barramentos de cobre aéreos com capacidade de 2000 A por fase.

Utilizando-se do aplicativo MatLab/Simlink®, foram realizadas simulações da compensação de reativos da instalação por meio de bancos operados por contatores e bancos operados por tiristores, tendo como entrada as medições obtidas em campo, mostradas na Figura 1.

A Figura 4 ilustra o resultado das simulações dinâmicas da compensação do fator de potência da instalação por meio de banco de capacitores manobrados por contatores. Foi considerado um banco com 16 estágios de 50 kVAr, perfazendo uma potência reativa total de 800 kVAr, a qual deveria ser capaz de elevar o fator de potência médio da instalação para 0,95 indutivo.

Conforme pode ser visto na Figura 4, os longos tempos necessários para a manobra dos bancos de capacitores por meio de contatores tornam o sistema ineficaz para a adequada compensação do fator de potência da instalação industrial.

Estão indicados na Figura 4 pontos em que o fator de potência encontra-se em valores ligeiramente superiores a 0,92 indutivo e, portanto, bastante aquém do valor médio esperado. O valor médio obtido, considerando um intervalo de inte

gralização igual a 30 minutos, foi de 0,937 indutivo.

Para a análise do desempenho do sistema utilizando-se banco de capacitores chaveados a tiristores, implementou-se um modelo computacional, no qual a manobra dos estágios do banco de capacitores é realizada dinamicamente, em um tempo da ordem de 25 ms. A Figura 5 ilustra os resultados obtidos. Conforme pode ser visto, a disponibilidade de um sistema de manobra rápida permite a elevação do fator de potência médio da instalação para um valor equivalente a 0,95 indutivo, tendo sido considerado um intervalo amostral para análise igual a 10 segundos, dos quais, um subintervalo de dois segundos encontra-se apresentado na Figura 4. Este resultado comprova o melhor desempenho e eficácia do sistema baseado em tiristores quando comparado com os sistemas convencionais baseados em contatores, uma vez que possibilita um controle mais fino do valor do fator de potência da instalação.

Figura 5 – Fator de potência da instalação com bancos manobrados pelo sistema dinâmico baseado em tiristores. Tempo total: dois segundos.

Operação dinâmica de bancos de capacitores chaveados a tiristores

A possibilidade de se utilizar tiristores para a conexão de bancos de capacitores e eliminação de correntes de inrush já é bastante conhecida e descrita na literatura [1-2]. Entretanto, devido ao maior custo de implantação do sistema, comparado com a solução convencional baseada em contatores, ela ainda não tem sido largamente utilizada no Brasil, o que não ocorre em países desenvolvidos, destacadamente, da Europa.

Conforme mostrado anteriormente, a compensação do fator de potência em cargas dinâmicas exige soluções com mais alto grau de sofisticação do que os sistemas convencionais. Neste sentido, duas soluções estão atualmente disponíveis: (I) filtros ativos de potência; (II) filtros passivos operados a tiristores. Em relação aos filtros ativos de potência, os sistemas baseados a tiristores apresentam as seguintes vantagens:

• Custos de instalação e manutenção significativamente inferiores;

• Maior robustez e maior Mean-time Between Failures (MTBF);

• Maior rendimento total do sistema;

• Menor volume;

• Maior facilidade de instalação e operação.

No entanto, as desvantagens do sistema baseado em tiristores com relação aos filtros ativos de potência são:

• Impossibilidade de seletividade das correntes a serem compensadas;

• Possibilidade de ocorrência de ressonâncias.

Embora não permitam seletividade com relação às correntes a serem compensadas, é possível incluir no controle do sistema baseado em tiristores algoritmos capazes de detectar a ocorrência de ressonância e emitir sinalização e/ou levar o sistema ao desligamento seguro.

Nas próximas seções, serão apresentados os requisitos para a implementação de um sistema de manobra de banco de capacitores baseado em tiristores.

Eliminação das correntes de inrush na energização do banco de capacitores

A Figura 6 ilustra, de modo esquemático, um sistema tiristorizado para a manobra de banco de capacitores sem a ocorrência das correntes de inrush. Conforme pode ser visto, normalmente são utilizados apenas dois conjuntos de tiristores em antiparalelo, formando duas chaves estáticas CA. A terceira fase é conectada diretamente à rede de energia.

Segundo descrito em [5], para que seja possível a energização do banco de capacitores trifásico, sem as elevadas correntes de inrush, é necessário que os tiristores sejam disparados no instante exato no qual não haja diferença entre as tensões do lado da rede e do lado do banco de capacitores, ou seja, no momento em que as tensões sobre as chaves estáticas sejam iguais a zero. Entretanto, devido à eventual presença de tensão residual nos capacitores, outra questão deve ser considerada.

De acordo com as formas de onda apresentadas na Figura 7, uma vez que os tiristores se abrem no momento do cruzamento por zero das correntes que os circulam, com o comando de abertura uma das chaves estáticas se abrirá primeiro. Após este instante, as tensões nos capacitores passam a depender apenas das suas tensões residuais e da tensão entre a fase diretamente conectada ao barramento e a fase que a chave estática ainda permanece em condução. Isto faz, após o desligamento total, um dos capacitores ficar com uma tensão igual ao pico da tensão da rede (positivo ou negativo), outro com tensão igual a 0,37 pu (positivo ou negativo) e o terceiro com o negativo da soma destas duas tensões, ou seja, ±1,37 pu.

 

No processo de religamento dos capacitores, é necessário, além do disparo dos tiristores no instante em que a tensão sobre os mesmos seja nula, que seja respeitada uma sequência pré-definida para o comando, a qual depende das tensões residuais em cada capacitor. A Figura 8 mostra as tensões dos capacitores em uma situação na qual o disparo da primeira chave CA é dado respeitando-se sua condição de tensão nula, mas sem observar a correta sequência de entrada das chaves. Conforme pode ser visto, a partir da entrada da primeira chave, todas as tensões do banco passam a variar senoidalmente. Entretanto, não se verifica nenhum ponto posterior adequado para o comando da outra chave CA, ou seja, não se observa instante no qual as tensões dos capacitores se igualam às demais tensões da rede.

 

Detecção de ressonâncias e capacitância fora da especificação

Manipulando-se algebricamente as tensões de fase instantâneas, é possível separar o conteúdo fundamental do harmônico e calcular um índice que refl

ita este último. Desta forma, torna-se possível estabelecer um limite máximo tolerável deste índice e desconectar o banco de capacitores em caso de valores mais elevados. As principais vantagens de tal método em relação ao cálculo da transformada rápida de Fourier (FFT, na sigla em inglês) são o menor custo computacional e menor tempo de resposta, uma vez que o índice é calculado a cada ciclo de amostragem.

A Figura 9 ilustra uma situação em que o sistema de controle leva à desconexão do banco de capacitores em um tempo inferior a um ciclo, devido à detecção de ressonância.

 

A disponibilidade de medição das correntes dentro do delta do banco de capacitores permite o acompanhamento do nível das correntes harmônicas de sequência zero, o que torna mais eficaz a proteção do banco de capacitores contra sobrecorrentes ou ocorrência de ressonâncias.

A detecção de capacitância fora da faixa especificada pode ser implementada calculando-se, a partir da medição das tensões e correntes, os valores das capacitâncias entre fases.

Resultados experimentais

A Figura 10 mostra o sistema desenvolvido para manobra de banco de capacitores sem a ocorrência de inrush. Este equipamento (50 kVAr/440 V) incorpora funções de eliminação de inrush, detecção de condições de ressonância, capacitância fora da faixa especificada, além de desequilíbrios de tensão e/ou corrente.

A Figura 11 apresenta os resultados experimentais da entrada em operação do sistema de conexão de banco de capacitores, em uma condição na qual todas as tensões residuais dos capacitores são nulas. Nesta figura, são mostradas as tensões e correntes nos capacitores. Conforme pode ser visto no processo de conexão mostrado, o inrush de corrente é completamente eliminado.

A Figura 12 apresenta os resultados experimentais da operação dinâmica e intermitente do banco de capacitores chaveados a tiristores. Neste caso específico, o sistema foi comandado para operar com ciclos de 80 ms com o banco conectado, seguido de um período de 80 ms com o banco desconectado. Destaca-se, nesta figura, a conexão dos capacitores com tensão residual não nula e com eliminação das correntes de inrush.

 

Conclusões

Sistemas industriais caracterizados por elevado número de cargas com demanda variável e dinâmica de potência reativa apresentam dificuldades de correção do fator de potência pelos sistemas convencionais baseados em bancos de capacitores chaveados por contatores. Nestes casos, uma alternativa que alia baixo custo e capacidade dinâmica adequada são os sistemas baseados em capacitores chaveados

por tiristores. Conforme apresentado, estes últimos permitem uma compensação mais eficaz da potência reativa, aliada a outras funcionalidades, como detecção de condições anormais de operação, ocorrência de ressonâncias, sobrecargas e capacitâncias fora da faixa especificada. Aliado a isso, os sistemas baseados em tiristores permitem a eliminação das correntes de inrush do banco de capacitores, o que promove um aumento de sua vida útil e redução dos distúrbios de energia na instalação provocados por estas correntes.

É importante ressaltar que a correta aplicação dos sistemas tiristorizados requer a utilização de módulos de controle de fator de potência com saída a transistor (normalmente, na configuração open-collector), uma vez que os módulos convencionais de controle de fator de potência apresentam saída a relé e, portanto, sem a possibilidade de geração de sinais de comando suficientemente rápidos para a manobra dos bancos chaveados a tiristores.

Um estudo de caso real da aplicação deste tipo de tecnologia em uma indústria automobilística é apresentado, além de resultados experimentais da operação do compensador na manobra do banco de capacitores.

Referências

[1] – Miller, T. J. E. Reactive Power Control in Electric Systems. John Wiley and Sons. Canadá, 1982.

[2] – Hingorani, N. G.; Gyugyi, L. Understanding FACTS: Concepts and Technology of Flexible AC Transmission Systems. IEEE-Wiley Press. New York, 1999.

[3] – Karady, G. G. Continuous Regulation of Capacitive Reactive Power. IEEE Transactions on Power Delivery, v. 7, n. 3, July 1992.

[4] – Grijp, M. H.; Hopkins, R. A. Controlled Switching of Shunt Capacitors. In proceedings: IEEE 4th AFRICON, v. 2, p. 874-879. Stellenbosch, South Africa, 1996.

[5] – Jianhua, Z.; Guangping, D.; Gang, X. et. al. Design of the Control System for Thyristor Switched Capacitor Devices. In proceedings: IEEE Transmission and Distribution Conference and Exposition, v. 2, p. 606-610, Sep. 2003.

[6] – Jalali, S. G.; Lasseter; R. H.; Dobson, I. Dynamic Response of a Thyristor Controlled Switched Capacitor. IEEE Transactions on Power Delivery, v. 9, n. 3, p. 1609-1615, July 1994.

[7] – Kusko, A.; Medora, N. K. Switching of Power Harmonic Filters. In proceedings: IEEE Industry Applications Society Annual Meeting, v. 2, p. 941-945, 1994.

[8] – Chavez, C.; Houdek, J. A. Dynamic Harmonic Mitigation And Power Factor Correction. In proceedings: IEEE Industrial Electronics Society, 9th International Conference on Electrical Power Quality and Utilization. 5 p. Barcelona, 2007.

 

*Gleisson J. França é mestre e doutorando em engenharia elétrica e atua como gerente de engenharia na HPE Indústria e Comércio de Equipamentos Eletroeletrônicos Ltda.

Marcos Isoni Silva é especialista em sistemas de energia, com ênfase em qualidade da energia elétrica e mestre em eletrônica de potência/qualidade da energia. Cofundador e atual sócio-diretor técnico da Engeparc Engenharia.

Sidelm

o Magalhães Silva é mestre e doutor em engenharia elétrica. Atualmente, é professor do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, atuando em cursos de graduação e pós-graduação (stricto sensu) em Engenharia Elétrica.

Este trabalho foi originalmente apresentado durante a oitava edição da Conferência Brasileira sobre Qualidade da Energia Elétrica (VIII CBQEE), realizada entre os dias 2 e 5 de agosto de 2009 em Blumenau (SC).

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