Era com essa afirmação que os mascates, que chamávamos marreteiros, atraiam a atenção das pessoas para vender descascador de laranja, abridor de latas e outras bugigangas. Mas o que isso tem a ver com a eletricidade? Nada!
Eletricidade acima de extra-baixa tensão não é para leigos. Não se vê, não tem cheiro e nem cor, mas tem potencial para causar danos e, por isso, exige respeito e conhecimento específico.
Já tratamos desse assunto nesta coluna, mas, ao que parece, é necessário repetir porque ainda tem muita gente argumentando que, por falta de mão de obra qualificada no mercado, é justo e lícito entregar serviços de eletricidade, próprios de profissionais qualificados, a pessoas “ligeiramente informadas” sobre como aplicar este ou aquele produto, ainda que essencialmente elétrico.
Não é senão a motivação para aumentar as vendas de tal produto ou criar uma clientela cativa que se cria um trabalhador iludido que entende de eletricidade e que tão pouco entende que acaba por se considerar um especialista.
Não se pode atribuir ao pedreiro, por mais capaz que seja na sua profissão, as responsabilidades por instalar e montar equipamentos elétricos, sem que ele tenha as bases mínimas necessárias para o exercício da profissão de eletricista e essas bases quem estabelece é o Sistema Oficial de Ensino.
Atualmente, são encontradas no comércio verdadeiras instalações “prêt-a-porter”. Desde kits para alarme a “padrões” de entrada compostos de poste, caixa, chave geral, eletrodutos e condutores já enfiados, com isolador na ponta do poste. De lambuja, vem um metro de cantoneira de chapa dobrada, levemente galvanizada e um pedaço de cabo para fazer o aterramento.
Inicialmente, eram apenas entradas individuais. A coisa agradou e agora temos entradas coletivas, caixas com barramentos e montagens mais complexas, com barramentos e seccionadoras que não podem ser confiadas a leigos.
Em lojas e depósitos de materiais de construção, balconistas diligentes recomendam, dimensionam, tiram dúvidas, informam, instruem, dão dicas para o pedreiro e, pronto, foi criado um eletricista, o que meu amigo Joaquim chamaria de “pedreirista”. Um trabalhador que se julga capaz na área elétrica, quiçá um “eletropedreiro”.
Para agravar, a “moda pegou” e agravou. Fabricantes já se propõe a formar e a instruir clientes para empregar os produtos de sua fabricação. Seria ótimo e louvável se tivessem o mínimo critério e bom senso de instruir apenas os profissionais da área elétrica e não pedreiros e leigos, somente para vender seus produtos e criar clientela.
Ainda temos na lembrança a história dos “kits” de primeiros socorros, obrigatórios nos veículos. Então, foi eliminada a obrigatoriedade porque era um risco adicional e só tinha gaze, tesourinha, esparadrapo e outros apetrechos, mas o kit não tinha o principal, o profissional de saúde qualificado para prestar o atendimento.
Só para ilustrar, imaginemos que, preocupados com a falta de médicos nos locais mais remotos de nossa terra, os fabricantes de materiais cirúrgicos montassem kits para pequenas cirurgias, a de apêndice (apendkit), para extração de dentes (dentkit), acompanhados de um excelente manual explicativo, de forma que qualquer pessoa (alfabetizada) pudesse aplicar o equipamento.
Aplicação de injeção é tão simples. Pode?
Voltemos ao nosso caso:
Somente trabalhadores qualificados podem se envolver com instalações e serviços com eletricidade. É Lei – artigo 180 da CLT.
O ensino, a transmissão de conhecimento é uma atividade de grande nobreza, mas não pode ser um meio informal e irresponsável de conferir atribuições.
Na área elétrica, assim como nas demais áreas técnicas, as atividades devem ser realizadas e/ou supervisionadas por profissionais legalmente habilitados que estão obrigados a registrar no órgão fiscalizador do exercício profissional a sua responsabilidade técnica pela execução, condução e supervisão dos serviços, na forma da Lei.