Modelos de Solo Homogêneo

Por: Paulo Edmundo da Fonseca Freire

Solos homogêneos não existem na natureza. Este tipo de modelo de solo está associado a uma incerteza básica – não existe modelo de solo homogêneo que seja capaz de reproduzir a resistência de uma malha de aterramento e, simultaneamente, os gradientes de tensão na superfície do solo, o que significa tensões de passo e de toque. Qualquer método de redução de uma estrutura de subsuperfície multicamadas a um modelo homogêneo vai descaracterizar o modelo, resultando na impossibilidade de calcular de forma adequada os parâmetros desejados.

Porém, modelos de solo homogêneos podem ser úteis para cálculos rápidos, destinados a fornecer valores estimados de resistência de geometrias simples de aterramentos de pequenas dimensões. São úteis também como um índice que permita a comparação qualitativa de diferentes solos.

Este artigo baseia-se no paper HOMOGENEOUS GROUND MODELS, apresentado por Paulo Edmundo da Fonseca Freire e Wagner Costa, no evento GROUND2024 & 11th LPE – International Conference on Grounding & Lightning Physics and Effects, ocorrido em João Pessoa, Brazil, em novembro de 2024.

  1. Modelos de Solo Homogêneos pela IEEE-80

Metodologias de cálculo simplificado de malhas de aterramento requerem um valor único de resistividade do solo. Para o cálculo deste parâmetro, o Anexo E da IEEE-80/2013 propõe duas alternativas calculadas a partir dos valores de resistividade do solo obtidos da campanha de medições. Por ordem de simplicidade – média aritmética dos valores máximo e mínimo de resistividades aparentes ou média aritmética de todos os valores da curva média.

De acordo com a IEEE-80, estes critérios de cálculo foram obtidos com base em simulações de modelos de solo com duas camadas em que a diferença de resistividades é moderada. Pelo exemplo do Anexo E da IEEE-80, as metodologias de cálculo de modelo de solo homogêneo têm as seguintes restrições:

  • malha de pequeno porte (diagonal ≤ 70 m), em solo de baixa resistividade (≤ 250 Ωm);
  • diferença entre os valores máximo e mínimo de resistividades aparentes inferior a 4x;
  • curva média de resistividades aparentes característica de um solo de duas camadas (com apenas uma inflexão, para cima ou para baixo).

A 1ª opção pode ser assim equacionada: (méd. extremos)=(ρmín.+ρmáx.)/2.

Para esta alternativa, a IEEE-80 estabelece que a expressão é válida se a malha tiver hastes e se elas atingirem uma camada com a resistividade média calculada (exigência que limita drasticamente a aplicação desta alternativa). Ora, para se determinar se as hastes da malha atingem uma camada de solo com a mesma resistividade da média entre os extremos, há que se produzir um modelo de solo estratificado em camadas (1D) e depois verificar se a exigência é atendida. Ora, se já se tem a geometria da malha e o modelo de solo 1D, então é melhor usar um software adequado e concluir o projeto, sem as incertezas de uma modelagem extremamente simplificada e altamente questionável.

Aplicando o 2º método a uma curva média de resistividades aparentes que abranja o conjunto de espaçamentos do arranjo de Wenner até 32 m, tem-se:

ρ(médio)=a 1m+a 2m+a 4m+a 8m+a 16m+a (32m)6

Este método é enganoso, pois diferentes estruturas geoelétricas podem resultar em um mesmo modelo de solo, uma vez que para a média, a ordem dos fatores não altera o resultado; porém, sabe-se que a ordem das camadas geoelétricas vai ter impacto no desempenho da malha.

  1. Modelo de Solo Homogêneo – uma proposta alternativa

A norma NBR-15751 (Aterramento de Subestações) está sendo revisada, e faz-se necessário o estabelecimento de uma metodologia de cálculo de modelos de solo uniforme, naturalmente alertando para as restrições da sua aplicação.

A proposta mais simples é a adoção do 2º método da IEEE-80, porém, utilizando a média geométrica dos valores da curva média geométrica de resistividades aparentes, que abranja o conjunto de espaçamentos do arranjo de Wenner com uma abertura AB compatível com a diagonal do terreno a ser modelado. Estas premissas visam a coerência com os critérios da NBR-7117/2020, que estabelece que as resistividades do solo têm distribuição log-normal.

Para um terreno com diagonal máxima de 70 m, por exemplo, tem-se:

ρ(médio)=6a (1m)×a (2m)×a (4m)×a (8m)×a (16m)×a (24m)

Cabe observar que esta alternativa de cálculo está sujeita à mesma crítica já feita ao método proposto pela IEEE-80, uma vez que diferentes estruturas geoelétricas podem resultar em um mesmo modelo de solo, pois a ordem dos fatores contínua não alterando a média; porém, a ordem das camadas geoelétricas certamente vai ter impacto no desempenho da malha de aterramento.

Para contornar esta restrição do método, estamos propondo o cálculo da resistividade aparente média por meio da média geométrica das resistividades de cada espaçamento, porém ponderadas por pesos que de certa forma reflitam a sequência das camadas. A resistividade média geométrica ponderada pode ser calculada em função dos valores de resistividade aparente para cada espaçamento AB (ρAB) e do peso atribuído à cada abertura AB (wAB):

(a)=ei=1nABi i=1nwABi

Considerando que as malhas de aterramento estão sempre enterradas em profundidades rasas, é de se esperar que as camadas mais rasas do solo, onde é maior a densidade de corrente elétrica junto ao eletrodo, devem ter um peso maior do que as camadas mais profundas.

Pode-se então estabelecer duas alternativas de pesos: o inverso da abertura de sondagem AB, e o logaritmo deste parâmetro. Sugere-se o parâmetro AB pois assim o método pode ser aplicado a medições feitas tanto com o arranjo de Wenner como o de Schlumberger. A Tabela 1 revela que o logaritmo é um peso mais adequado, pois o parâmetro AB tem uma variação em progressão geométrica, e o seu uso tornaria irrelevantes as resistividades aparentes obtidas das aberturas maiores. 

Tabela 1: espaçamentos AB e respectivos logaritmos.

AB (m)3612244896192
log AB0,480,781,081,381,681,982,28

A resistividade média geométrica ponderada para uma dada curva de resistividades aparentes pode ser então assim calculada:

(a)=ei=1nABi i-1n1/logABi

Para o terreno com diagonal máxima de 70 m, conforme o exemplo da IEEE-80, o valor a ser exponenciado para a obtenção da resistividade média geométrica ponderada pode ser assim calculado:

ln médio =ln3m0,48+ln6m0,78+ln12m1,08+ln24m1,38+ln48m1,68+ln72m1,8610,48+10,78+11,08+11,38+11,68+11,86 

  1. Aplicação da Metodologia

A aplicação a um caso real exemplifica bem a metodologia de cálculo do modelo de solo uniforme proposta. A Tabela 2 apresenta uma curva média geométrica de resistividades aparentes calculadas a partir de uma campanha de sondagens Wenner para o projeto de uma UFV GD. Esta curva média atende ao critério de diferença entre os valores máximo e mínimo de resistividades aparentes inferior a 4x; porém, não atende ao critério de solo de dupla camada e, portanto, pelo critério da IEEE-80, uma malha de aterramento neste solo não poderia ser dimensionada por meio do método simplificado.

A média geométrica das seis resistividades aparentes desta curva é 585 Ωm. Para exemplificar a aplicação do método alternativo de cálculo do modelo de solo uniforme a resistividade média ponderada, conforme proposto, resulta em um valor médio de 475 Ωm, um pouco inferior à média geométrica simples, porque leva em conta o peso das resistividades aparentes mais baixas das camadas superficiais do solo, onde a malha está enterrada.

MN (m)ρ (Ωm)
1272
2413
4679
8959
16897
24610
Figura 1: curva média geométrica de resistividades aparentes calculadas a partir de uma campanha de sondagens Wenner para o projeto de uma UFV GD, e modelo geoelétrico de 3 camadas correspondente

Sobre o autor:

Paulo Edmundo Freire da Fonseca é engenheiro eletricista e Mestre em Sistemas de Potência (PUC-RJ). Doutor em Geociências (Unicamp), membro do Cigre e do Cobei e também atua como diretor na Paiol Engenharia.

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