Em pleno funcionamento

Edição 61 – Fevereiro/2011
Por Thaís Olivieri

Manter, restabelecer, conservar ou restaurar um equipamento. A manutenção industrial apresenta-se como uma prática obrigatória para as empresas que buscam estar à altura dos novos e exigentes padrões mundiais

“É melhor prevenir do que remediar”. “Quem cuida, tem”. “Quem planta, colhe”. São muitos os ditados populares que remetem ao cuidado constante e à preservação de uma ideia, de uma situação, de um relacionamento, de um objeto pessoal, enfim. Isso porque, quase sempre, a conservação de algo é muito mais vantajosa do que a sua reconstrução. Este é o mesmo conceito aplicado à manutenção de equipamentos e de máquinas de processos em geral, visto que o cuidado permanente e planejado é muito mais eficaz e economicamente mais interessante do que o descarte do equipamento e sua consequente substituição.

Mas este pensamento nem sempre existiu. A manutenção, cujo fim é a otimização dos recursos, a minimização dos custos e a garantia de qualidade nos resultados, é uma prática observada desde os primórdios – na conservação de instrumentos e ferramentas –, mas que passou a ser conhecida com essa denominação apenas no século XVI, período em que se deu o surgimento do relógio mecânico e que as primeiras máquinas têxteis a vapor foram inventadas.

Naquela época, o profissional que projetava os equipamentos era o mesmo que treinava o funcionário para operar e consertar. É importante ressaltar que, até então, o operador era o mantenedor mecânico. Somente no último século, quando as máquinas também começaram a ser movidas por motores elétricos é que a figura do mantenedor eletricista conquistou o seu espaço.

Ganhando força ao longo da Revolução Industrial, a manutenção firmou-se como necessidade absoluta no período em que ocorreu a Segunda Guerra Mundial. Logo no início da reconstrução pós-guerra, países como Inglaterra, Alemanha, Itália e, principalmente, Japão, se organizaram para que seu desempenho industrial fincasse seu alicerce nas bases da engenharia e da manutenção.

De acordo com o especialista Francois Monchy, autor do livro A função manutenção: formação para a gerência da manutenção industrial, o termo “manutenção” tem sua origem no vocábulo militar, cujo sentido era “manter, nas unidades de combate, o efetivo e o material em um nível constante”. As unidades que nos interessam aqui são as de produção, mas vale lembrar que o combate é antes de tudo econômico. O aparecimento do termo “manutenção” na indústria ocorreu por volta do ano de 1950 nos Estados Unidos. Na Europa, por exemplo, o termo se sobrepõe progressivamente à palavra “conservação”.

Com o decorrer dos anos e o fortalecimento da concorrência, as indústrias precisavam encontrar alternativas para driblar os atrasos tecnológicos e de produtividade. Era preciso se prevenir contra falhas de máquinas e equipamentos, ou seja, havia a necessidade urgente de mudanças técnicas e administrativas em todos os setores.

Essa motivação deu origem à manutenção preventiva, prática que nasceu para ser moderna e eficiente, acompanhando o ritmo de todo este processo tecnológico. Mas antes de se traduzir em mais um obstáculo aos meios produtivos, ela deveria buscar sempre as melhores soluções, tornando o conjunto mais ágil e dinâmico e, acima de tudo, respeitando o seu papel que é ser suporte da produção.

Foi então que, a partir da década de 1990, que a manutenção ganhou um grande impulso como consequência das mudanças postas em marcha na economia. A abertura comercial provocou uma grande transformação na produção industrial, trazendo novos conceitos para a racionalização dos processos dentro das plantas. “Foi uma verdadeira marcha forçada no desenvolvimento econômico, o que levou as companhias brasileiras a uma revisão dos seus processos gerenciais e de produção”, recorda o presidente da Associação Brasileira de Manutenção (Abraman), José Eduardo Lobato, explicando ainda que não é por outra razão que a manutenção, considerada até os anos 1980 uma atividade menor, ganha o status de unidade de negócios nas empresas, aumentando ano a ano sua participação dentro da economia.

O presidente ainda destaca que, para uma empresa ser competitiva, é necessário ter processos que assegurem a confiabilidade, a qualidade e a segurança operacional, assim como preservar o meio ambiente e ter pessoal altamente qualificado e motivado. “Essa ideia passou da simples retórica para uma ação que necessita ser praticada por todos, independentemente do setor e da atividade econômica”, esclarece.

Atualmente, a expansão das unidades industriais e novas plantas primam pela utilização de tecnologia de ponta com equipamentos e máquinas de última geração para obter desempenho compatível com as exigências relacionadas à produtividade e à lucratividade. “Se a tecnologia é importante, a qualificação do pessoal de manutenção é indispensável para um bom desempenho da indústria”, reforça Lobato.

Na figura a seguir, é possível observar que a evolução da manutenção foi subdividida até a década de 1970, quando a sua realização fundamenta-se no planejamento e na programação para antecipar qualquer eventual falha da máquina.

Qualidade: planejamento das atividades

Com o claro objetivo de garantir a permanência na operação dos equipamentos e instalações nas condições especificadas e o atendimento no menor prazo possível, a manutenção ganha destaque entre as empresas que, vivenciando a globalização dos mercados e uma concorrência cada vez mais acirrada, buscam conter seus custos e, ao mesmo tempo garantir, o pleno funcionamento das operações.

“O plano de manutenção deve levar em conta o ritmo da produção e a necessidade dos equipamentos e das instalações”, explica o gerente do departamento de manutenção da Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (Cteep), Antonio Manuel Corvo, que ressalta ainda que o pessoal de produção deve ser o primeiro mantenedor, princípio básico da Manutenção Produtiva Total (MPT), assim como a Manutenção Centrada em Confiabilidade (MCC) também deve ser o ponto de partida do planejamento das atividades. ”A equipe de manutenção deve estar adequadamente estruturada com as responsabilidades bem definidas sobre as várias fases do processo”, diz.

Tal realidade fez as companhias adequarem sua qualidade à altura dos novos e exigentes padrões mundiais. Foi então que o conceito de Controle de Qualidade Total (TQC, sigla para Total Quality Control) tornou-se condição fundamental para a competitividade e sobrevivência dessas empresas.

O TQC não é um conceito novo, mas sim uma nova filosofia que influencia deci

sivamente a maneira de conduzir os negócios. Apesar de seus princípios terem surgido nos Estados Unidos, antes da Segunda Guerra Mundial, sua aplicação concreta aconteceu com bastante sucesso no Japão, quando, ao final da guerra, os japoneses deram início ao processo de melhorias contínuas em suas indústrias. Desde então, inúmeros refinamentos foram introduzidos, chegando ao atual estado da arte, que busca não só o aperfeiçoamento contínuo dos métodos de trabalho, mas, de forma mais ampla, a qualidade total de bens e serviços, que não só satisfaça às necessidades do cliente, mas que exceda suas expectativas.

Isto significa submeter todos os processos a melhorias contínuas na busca por qualidade total, utilizando-se de ferramentas gerenciais das mais diversas, com destaque para a manutenção produtiva total quando se tratar de processos industriais. Vale ressaltar que esta, além de um elo importante para a prática do “just-in-time“, é também decisiva na qualidade final do produto. “Hoje as empresas modernas percebem que investir em manutenção é um excelente negócio. Trata-se de uma quebra de paradigma, relativamente recente, em que a manutenção deixa de ser encarada como um simples custo para ser vista como um investimento”, comenta o gestor da unidade de manutenção da transmissão da companhia energética do Rio Grande do Norte, Igor Mateus de Araújo.

Veja, a seguir, um diagrama dos principais processos que integram a função manutenção.

Classificando a manutenção

Quando se fala em antever ou evitar problemas é válido que se defina os tipos de manutenção passíveis de serem realizados, almejando os melhores resultados considerando as condições e as necessidades de cada companhia.

A manutenção corretiva, por exemplo, é aquela em que os consertos e as reformas são realizados quando o objeto, máquina, equipamento ou veículo já está quebrado. A preventiva é aquela em que as quebras e as paradas das máquinas são detectadas com antecedência, ou seja, essa manutenção é programada para ser realizada antes do provável surgimento de uma falha.

Já a manutenção preditiva, por sua vez, vem recebendo, de acordo com Igor Mateus de Araújo, muitos investimentos por parte das empresas. “Esta é uma prática que se caracteriza basicamente por um conjunto de técnicas avançadas de análise, por meio das quais podemos concluir sobre o estado de conservação do sistema, sem a necessidade de seu desligamento”, explica ele, chamando a atenção para a termografia, modalidade que atualmente atingiu grande relevância, sobretudo no setor elétrico, em que falhas incipientes (os chamados pontos-quentes) podem ser detectadas com alta precisão e as ações podem ser tomadas no sentido de evitar o seu agravamento, que futuramente poderia resultar em falha.

Já Antônio Corvo, da Cteep, ressalta que, com as facilidades de recursos de informática atualmente disponíveis nas empresas, deve-se pensar em uma nova forma de manutenção baseada no conceito VIE – Very Important Equipment (equipamento muito importante). “A manutenção centrada em confiabilidade não deve mais considerar as famílias de equipamentos, mas, sim, o equipamento individualmente, estabelecendo a sua importância no sistema, o seu modo de falha, as consequências dessas falhas, etc. Acredito que esta será a manutenção do futuro”, prevê o especialista.

Tipos de manutenção

FORMAS

VANTAGENS

DESVANTAGENS

CORRETIVA

* não exige acompanhamentos e inspeções nas máquinas.

* as máquinas podem quebrar durante o horário de produção;
* as empresas utilizam máquinas de reserva;
* há necessidade de se trabalhar com estoques.

 

 

PREVENTIVA

* assegura a continuidade do funcionamento das máquinas, parando para consertos em horas programadas;
* a empresa terá mais condições de cumprir seus programas de produção.

* requer um quadro (programa) bem montado;
* requer uma equipe de mecânicos eficazes e treinados;
* requer um plano de manutenção.

 

PREDITIVA

* aproveita-se o máximo de vida útil dos elementos da máquina, podendo-se programar a reforma e substituição somente das peças comprometidas.

* requer acompanhamento e inspeções periódicas, por meio de instrumentos específicos de monitoração.

A engenharia

“Um conjunto de estratégias que podem e devem ser adotadas para viabilizar e, principalmente, otimizar a manutenção”. É dessa forma que Araújo define a engenharia da manutenção. “Costumamos dizer que a engenharia de manutenção é o cérebro por trás das ações, pensando em como elas podem ocorrer e, principalmente, na melhor maneira de executá-las”, diz. Segundo ele, a tarefa desse departamento é definir e acompanhar os planos de manutenção; analisar os indicadores de desempenho; analisar as falhas ocorridas e propor ações corretivas no sentido de evitar a sua reincidência; gerir os recursos de manutenção, procurando otimizar a sua alocação; monitorar os ativos de sistema, propondo melhorias; administrar e reduzir os custos sem perda de qualidade; entre muitas outras ações.

Resumindo, é a área da manutenção responsável pelos processos de planejar, controlar e atuar em melhorias. “Em cada etapa do processo da manutenção, devemos ter pessoas capacitadas, equipadas e atualizadas, de modo a possibilitar sempre a busca da melhoria contínua”, comenta Corvo, esclarecendo que é fundamental a geração dos indicadores de controle técnico e de processos, pois serão eles a base para o estabelecimento de planos de melhorias técnicas e organizacionais.

Manutenção movimentou R$ 120 bi em 2010
Segundo a pesquisa “Mapa da Manutenção”, realizada pela Associação Brasileira de Manutenção (Abraman), a indústria da manutenção movimentou mais de R$ 120 bilhões em 2010, sendo que o investimento atual foi 33% maior do que na última edição da enquete, realizada em 2009, quando as empresas revelaram um aporte de R$ 90 bilhões na área. É importante ressaltar que o crescimento está diretamente ligado ao aumento da produção e a investimentos para evitar paradas não programadas e acidentes ambientais. O levantamento foi realizado com as maiores empresas do país e foram cons

ultadas companhias dos setores de papel e celulose, petróleo e gás, siderúrgico, saneamento, metalúrgico, petroquímico, têxtil, energia, transporte e automotivo.

Foi apurado que do total dos investimentos, as empresas deverão gastar, de acordo com a composição histórica dos custos de manutenção, 33% com material, 31% com pessoal próprio e 27% com serviços contratados.

Vale destacar que, para 44% das empresas ouvidas, a idade média de equipamentos e de instalações varia de 11 a 20 anos. No entanto, 31% das companhias têm ativos entre novos e com dez anos de utilização. Apenas 25% das indústrias, que responderam à pesquisa, afirmaram possuir máquinas e plantas com idade superior a 21 anos.

“É importante destacar que as empresas declararam na pesquisa um aumento da manutenção corretiva e a redução da preditiva, permanecendo o nível da preventiva. Em contrapartida, verificou-se discreto aumento na indisponibilidade devido à manutenção, embora a disponibilidade operacional dos equipamentos, que mede o valor médio do tempo em que os ativos físicos estiveram aptos para produzir, tenha ficado em 90,27%. Esse número está dentro dos padrões internacionais”, explica o presidente da Abraman, destacando ainda que o custo da manutenção permanece em 4,14% em relação ao patrimônio imobilizado e ao faturamento bruto das empresas. “Esse dado está acima da média mundial, que fica em 4,12%”, enfatiza Lobato.

A pesquisa mostra também que 51,28% das empresas demandam por mão de obra com maior grau de especialização, além de exigir cada vez mais a capacitação do profissional de manutenção em mais de uma especialidade.

Manutenção no setor elétrico
O papel da manutenção tem recebido cada vez mais destaque dentro do setor elétrico. Porém, é preciso lembrar que existe uma característica básica diferente em relação à manutenção de uma planta industrial: dispersão ou descentralização das instalações. “Existem empresas com mais de 100 subestações espalhadas dentro de um Estado ou em vários Estados brasileiros e milhares de quilômetros de linhas de transmissão, sendo importantíssima a logística de atendimento a essas instalações”, esclarece o gerente do departamento de manutenção da Cteep, Antonio Manuel Corvo.

É importante explicar que essa logística deve estabelecer uma distância máxima de localização das equipes, considerando o tempo de atendimento, a existência de telecomando para atuação rápida no caso de religamentos e a localização de mantenedores nas instalações consideradas estratégicas. “Estes mantenedores representam papel fundamental dentro da filosofia moderna de manutenção e devem estar capacitados para o primeiro atendimento às instalações estratégicas e garantir o pronto restabelecimento quando houver falhas que não exigem a intervenção de uma grande equipe para o seu atendimento”, diz ele. Corvo acrescenta que, em geral, as empresas do setor elétrico focam seus investimentos em automatismos e telecomandos, contribuindo para a gestão das instalações.

O futuro da manutenção
Atualmente, o perfil do profissional de manutenção é formado por mão de obra com nível superior (8%), com técnicos de nível médio (17%) e pessoal qualificado em minicursos (39%); os demais (36%) são formados na própria empresa ou não informaram a qualificação na pesquisa “Mapa da Manutenção”.

Por todas essas razões, a manutenção estará sempre na vida das companhias. Assim como o corpo humano, as instalações industriais precisarão de acompanhamento e prevenção. As evoluções, com certeza, trarão mudanças tecnológicas, mas uma coisa é certa: o homem será a peça fundamental na manutenção do futuro. Não há possibilidade de máquinas fazerem esse trabalho. Quanto mais automatizado for o processo de manufatura, mais a manutenção será dependente do homem, seja daqui a 20 ou 50 anos.

No futuro, um robô poderá substituir os rolamentos de um determinado equipamento, mas nunca fará uma análise da causa de seu desgaste. Prova disso é a exigência atual, cada vez maior, de que um mantenedor faça um diagnóstico preciso das causas de falhas e defeitos. A Associação não acredita que irão inventar computadores que consigam responder a perguntas comuns em uma análise de falhas, pois todas as respostas dependem de uma série de aspectos dos processos individuais, que estão ligados à capacidade do intelecto humano.

Esse futuro já dá uma mostra do que tem reservado para o setor. Na Petrobras, por exemplo, um engenheiro mecânico que trabalha na sede da empresa no Rio de Janeiro tem condições de acompanhar, online, o espectro de vibração de uma máquina que pode estar em qualquer uma das plantas da companhia a milhares de quilômetros. Isso já é o futuro, o mantenedor sentado a uma mesa, com o equipamento a uma longa distância. Em breve, todo o processo de análise para bloquear causas e falhas poderá ser feito remotamente e as intervenções se restringirão àquelas diagnosticadas a distância.

José Eduardo Lobato, presidente da Associação Brasileira de Manutenção (Abraman)

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