Correntes harmônicas em instalações elétricas – Parte 1 – Quando e como filtrar? Filtros passivos ou filtros ativos?

Edição 68 / Setembro de 2011
Por José Starosta

Correntes harmônicas surgem nas instalações elétricas devido à presença de cargas não lineares. Cada uma dessas cargas tem suas características específicas, incluindo as correntes harmônicas. Assim, um quadro terminal ou um quadro de distribuição apresentará em seu circuito alimentador correntes harmônicas (correntes com frequência diferente da frequência fundamental) que representam a soma das correntes harmônicas das cargas alimentadas por esses quadros.

É importante notar que cada uma dessas correntes harmônicas possuem módulos e ângulos de fase em cada uma das frequências características, fazendo a soma escalar de diversas correntes harmônicas em uma mesma frequência não representar a corrente harmônica total nessa frequência no circuito alimentador. Em outras palavras, se um determinado quadro de distribuição alimenta as cargas “A”, “B” e “C” que possuem em seus espectros correntes de 5ª harmônica de 100 A, 80 A e 50 A respectivamente, a corrente no alimentador geral não será necessariamente de 230 A, será necessário avaliar o ângulo de fase de cada uma dessas correntes e proceder a soma vetorial.

 

A circulação de correntes harmônicas nos circuitos e nas fontes (transformadores, geradores, UPS, etc.) causa o surgimento das tensões harmônicas proporcionais às próprias correntes harmônicas e às impedâncias desses circuitos e fontes. As limitações das normas que versam sobre este assunto tratam de estabelecer limites de distorções de tensão em função do ponto da instalação e dos níveis de tensão. Normalmente, essas normas são referenciadas no ponto de acoplamento comum (PAC) entre a concessionária e o consumidor, podendo variar de 5% a 10% dependendo da norma e do nível de tensão. Para mais informações sobre estes limites, consulte o documento “Aneel – Prodist módulo 8”, disponível no site dessa agência.

Uma das formas de reduzir a circulação destas correntes harmônicas é filtrá-las, evitando, assim, que as tensões dos barramentos sejam distorcidas pela alimentação das cargas não lineares.

Naturalmente, outras possibilidades de redução das distorções de tensão são:

  • Distribuição de cargas em outras fontes: nesta situação, cargas não lineares são relocadas na instalação, de modo a reduzir os valores de distorção de tensão nos barramentos em que elas são conectadas;
  • Aumento da potência das fontes: o aumento da potência das fontes reduz a impedância de curto-circuito à montante da carga, reduzindo as distorções de tensão nos barramentos;
  • Uso adequado de transformadores defasadores;
  • Especificação de cargas com controle de emissão ou escolha de cargas com melhores características.

Portanto, a simples existência de correntes harmônicas, por “maiores” que sejam – sem uma correspondência em incremento nas tensões harmônicas nos barramentos que as alimentam – não é normalmente razão para intervenção. A discussão sobre o quanto uma carga é distorcida deve considerar não somente a distorção total de corrente (THDI), ou as correntes harmônicas relacionadas à corrente da componente fundamental, mas também estas correntes harmônicas relacionadas à capacidade de corrente da fonte (transformador, por exemplo).

Instalação de filtros

A instalação de filtros de correntes harmônicas, ou simplesmente filtros de harmônicas, surge como outra possibilidade para adequação dos valores registrados de distorção de tensão por conta do controle das correntes harmônicas. De uma forma geral, os filtros evitam que as harmônicas circulem pelas fontes, reduzindo, portanto, as tensões harmônicas à montante e, por consequência, reduzindo também as distorções de tensão nos barramentos de baixa tensão. Os filtros mais comumente aplicáveis são os filtros passivos e, ultimamente, os filtros ativos vem tomando espaço. Ambas as aplicações estão descritas na sequência.

Filtros passivos

Os filtros passivos são normalmente compostos por conjuntos de indutores e capacitores sintonizados em uma frequência de ressonância característica. Podem também ser construídos em conjuntos, de forma a serem sintonizados em várias frequências desejáveis simultaneamente. A função dos filtros passivos é de absorver as correntes harmônicas da carga, impedindo que elas circulem pela rede. Devido à sua própria construção, também injetam energia reativa na rede, enquanto as harmônicas são absorvidas (em geral, a absorção das harmônicas não é total, mas, normalmente, é uma parcela daquelas geradas pela carga). Caso a carga seja variável, a construção desses filtros deve prever o arranjo em grupos de filtros para adequar a sua operação à variação da carga, evitando sobrecompensação de energia reativa.

A Figura 1 apresenta o registro da distorção harmônica de tensão em um barramento em que um filtro passivo com manobra estática, com tempo de resposta de 16 ms e composto por 6 grupos de 100 kvar, foi instalado. Neste caso, todos os grupos estão sintonizados em frequência próxima à 5ª harmônica. A Figura 2 apresenta o comportamento da corrente de 5ª harmônica na rede antes e depois da inserção do filtro passivo. Há uma relação de compromisso muito importante na construção deste filtro, visto que alguns módulos operam em paralelo e buscam a injeção de energia reativa em intervalos muito curtos, filtrando a 5ª harmônica simultaneamente. A distorção de tensão é reduzida de valores médios de 8% para 5%.

Figura 1 – Comportamento da distorção total de tensão. Fonte: Ação Engenharia e Instalações.

Figura 2 – Atenuação da corrente de 5ª harmônica com o uso de filtro passivo com manobra estática. Fonte: Ação Engenharia e Instalações.

A Figura 3 apresenta este filtro com seis estágios de 100 kvar e manobra estática em ensaio na fábrica. Em função da demanda da carga, os grupos são manobrados em ciclos de 16 milissegundos, compensando a energia reativa compensada e filtrando as harmônicas das cargas.

Figura 3 – Filtro passivo com manobra estática de seis estágios. Fonte: Elspec.

Filtros passivos antirressonantes – solução para evitar ressonância em capacitores

Sistemas antirressonantes ou filtros antirressonantes são filtros passivos como os apresentados anteriormente, cuja sintonia, entretanto, não é próxima às frequências presentes na corrente das cargas, mas em outra faixa. Esta aplicação é bastante comum e econômica quando se deseja proteger os capacitores e evitar que eles provoquem ressonância harmônica em redes que suportam a presença de cargas não lineares e não se deseja a redução da distorção de corrente. Os indutores antirressonantes adequadamente dimensionados elevarão a impedância do ramo do capacitor, de forma a controlar as correntes harmônicas que circularão nos capacitores e na rede. Para a decisão entre utilização de filtro ressonante ou antirressonante, pode-se fazer uso da norma IEEE 519, que estabelece limites de distorção de tensão a serem atendidos, isto é, mesmo na presença de cargas deformantes, nem sempre se faz necessária a aplicação de filtro sintonizado. O que definirá isso será a resposta do sistema elétrico existente (fontes e outras cargas), além das cargas deformantes na presença dos capacitores a serem instalados.

A injeção de energia reativa com filtro antirressonante (indutores e capacitores) reduz a corrente fundamental na proporção da relação do fator de potência original e o corrigido (após a injeção dos reativos). É de se esperar um natural aumento da distorção de corrente (THDI) e redução da distorção de tensão (THDV), por conta de circulação de parte das correntes harmônicas pelos capacitores.

Filtros ativos

Os filtros ativos, apesar de terem a mesma função dos passivos, são concebidos por equipamentos eletrônicos que injetam correntes harmônicas defasadas adequadamente daquelas geradas pelas cargas, de modo que, ao se somarem, se cancelem. Enquanto os filtros passivos são normalmente dependentes e especificados pelos valores dos indutores, capacitores e elementos de manobra que os compõe, os filtros ativos são especificados pelos “àmperes” que irão filtrar.

O entendimento do filtro ativo pode ser o de uma “máquina de corrente elétrica”, em que são geradas não só correntes harmônicas em diversas frequências em função da presença de cada uma delas, como na própria frequência fundamental, que poderão servir para equilibrar as correntes nas fases, ou até mesmo para adiantar as correntes da frequência fundamental em relação à tensão, melhorando, assim, o fator de potência.

A Figura 4 apresenta a ilustração da operação real de um filtro ativo. Nesta figura, podem-se verificar as formas de onda de corrente na carga, no filtro, e a resultante na rede de alimentação (corrente filtrada).

Figura 4 – Forma de onda das correntes na carga, filtro e rede. Fonte: Lacerda Sistemas.

Filtros passivos versus filtros ativos

Pelo exposto, a solução de escolha entre filtros ativos e passivos dependerá fundamentalmente da aplicação relacionada ao custo-benefício da escolha.

O entendimento que parece bastante aplicável nesta fase de custos das tecnologias no nosso mercado é o de que filtros passivos compensam energia reativa e fator de potência e também filtram as correntes harmônicas, enquanto filtros ativos filtram as harmônicas e também compensam o fator de potência. Ainda, a especificação dos filtros passivos é normalmente feita em potência reativa (kvar) e a dos filtros ativos em corrente (A).

A escolha dependerá da necessidade específica de cada caso. Em casos recentes observados, citamos:

  • Prédio comercial com transformador de 2.000 kVA, com distorção total de tensão de até 10% e fator de potência da ordem de 95%.
  • Indústria de acumuladores com transformador de 1.500 kVA com distorção total de tensão de 5% e fator de potência menor que 70%.

A instalação de um filtro passivo no primeiro caso não é indicada ou não será suficiente para filtrar as correntes harmônicas que causam a distorção de tensão. Para que o filtro passivo cumpra seu papel e opere sem sobrecarga, será necessário injetar potência reativa superior àquela demandada pela carga, originando sobretensões no barramento.

Já no segundo caso, a instalação de filtro ativo seria útil na redução das correntes harmônicas, contudo, sua aplicação na compensação (do ângulo) da corrente fundamental traria custos muito superiores à solução com capacitores.

Uma possibilidade aplicada em alguns projetos é o uso misto, com o sistema de compensação de energia reativa efetuada com o uso de filtros passivos (com o uso de reatores antirressonantes), sendo os filtros ativos somente aplicados às correntes harmônicas. Neste caso, o uso de reatores antirressonantes (filtro antirressonante) na compensação reativa é importante, uma vez que caso o filtro ativo venha a falhar por alguma razão, o sistema estaria sujeito à ocorrência de ressonância provocada pelos capacitores sem reatores.

Conclusões

Cargas não lineares
produzem correntes harmônicas que podem causar níveis de distorção de tensão acima dos limites das normas.

Além de soluções aplicáveis nas instalações, com remanejamento de fontes e cargas, os filtros podem reduzir a circulação de correntes harmônicas nas instalações.

Os filtros podem ser concebidos em construção de filtro passivo ou ativo, sendo a melhor solução dependente do objetivo do projeto, normalmente relacionado à necessidade de injeção de energia reativa ou somente à redução das correntes harmônicas.

Referências

  • Prodist – Módulo 8
  • IEEE 519
  • IEEE 1159
  • IEC 61000
  • ABNT NBR 5410
  • Elspec Ltd – Technical Reports
  • Ação Engenharia e Instalações – Relatórios técnicos

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